domingo, 1 de julho de 2012

Procissão de São Pedro e a Colônia de Pescadores de Itapoã.

Nesse dia, numa manhã marcada por um céu limpo e águas tranquilas, a praia de Itapoã, em Vila Velha (ES),  se tornou palco de mais uma manifestação religiosa, a procissão de São Pedro Pescador. Com o sorriso estampado no rosto, as famílias enfeitaram os seus barcos, com bolas e bandeirolas coloridas, sustentadas por varas de pescar. Tudo estava pronto para o grande momento. 

O interessante que mesmo cercados por prédios e condomínios suntuosos, os pescadores de Itapoã, resistem. Aquele espaço, aquela praia constituem ainda o lugar daquelas famílias. Partindo da concepção dos geógrafos Archela, Gratão e Trotdorf (2004), esse "[...] lugar é ocupado por sociedades que ali habitam e estabelecem laços tanto no âmbito afetivo, como também nas relações de sobrevivência." 










Ao todo nove pequenas embarcações de madeira se lançaram ao oceano e as braçadas de homens e mulheres, com a força, a coragem e a fé, seguiam com a imagem de São Pedro, em torno das ilhas de Itapoã. Algumas famílias ficaram na praia aguardando o desfile dos barcos. O interessante é que ali, representantes da capitania dos portos, ouviam com certa indiferença, as histórias das antigas procissões da região. Estas, possuiam muito mais barcos do que atualmente e  percorriam rotas muito maiores. Um dos pescadores com um tom de lamento e saudosismo, contava tudo com o brilho nos olhos. 
Enquanto isso, aos poucos, os membros da comunidade eclesial de base São Pedro Pescador, se amontoavam no calçadão de Itapoã, aguardando a chegada da pequena procissão.




Após quarenta e cinco minutos, os pescadores e a imagem do santo, chegaram à praia. Foram saudados, com muita alegria pelos devotos e pelos banhistas que por acaso, presenciaram esse momento. 

Foi impressionante ver nos rostos dos devotos a felicidade por terem assegurado a realização de mais uma histórica procissão marítima. Um deles, segurava a imagem do santo com o visível sentimento de missão cumprida, estampado nos olhos.  Ao som de cânticos religiosos que saudavam o santo e de palmas que ecoavam pela praia, a procissão deu continuidade pela areia até finalmente chegar a pequena comunidade católica São Pedro Pescador.






Essa manifestação religiosa, é mais um exemplo de como a colônia dos pescadores, procuram assegurar a apropriação do espaço geográfico, que eles mesmos construíram há décadas e que está sendo aos poucos tomado pelos grandes empreendimentos imobiliários. "O fenômeno religioso, [...] está além de suas implicações espaciais imediatas.” (GIL FILHO, 2009, p. 253). Por ele é possível verificar que outros elementos não visíveis, também fazem parte e determinam esse espaço geográfico. Nessa perspectiva, esta procissão é a materialização do sentimento de manter viva a história, as tradições e a cultura do homem pescador. 



"O homem é o fator dominante do meio ambiente e o seu comportamento deve ser completamente compreendido e não simplesmente mapeado." (TUAN, 1980, p.02). Por isso, faz-se necessário estudos científicos que desvelem as verdadeiras intenções que emergem das ações que estão visíveis aos nossos olhos. Qualquer iniciativa de intervenção nessa região, deve ser antes repensada e fundamentadas nesses estudos. 

Na imagem acima, vemos um barco, uma rede e uma propaganda imobiliária. Dois mundos que se sobrepõem no mesmo espaço. Se nada for feito, esse barco e essa rede desaparecerão sobre as bases de um grande condomínio. São duas visões de mundo que disputam o mesmo clima bucólico de Itapoã.

Nesse cenário, nessa paisagem o sentimento religioso pode ser o ponto de partida para esses estudos de natureza antropológica, geográfica e histórica. O início para a descoberta da essência do fenômeno que se manifesta sobre os nossos olhos, a partir das ações humanas no espaço geográfico.

Prof. Ms. Ernandes de Oliveira Pereira





Referências

ARCHELA, Rosely Sampaio; GRATÃO, Lucia Helena B. ; TROTDORF, Maria A. S.. O Lugar dos Mapas Mentais na Representação do Lugar. Geografia, Londrina, Volume 13, nº 01, Jan/Jun. 2004. P. 127 – 141

GIL FILHO, Sylvio Fausto. Por uma Geografia do Sagrado. In.: MEDONÇA, F.; KOZEL, S. (orgs.). Elementos de Epistemologia da Geografia Contemporânea. Curitiba:Ed. Da UFPR, 2002. P. 253-265.

TUAN, Yi-Fu. Topofilia. Tradução de Lívia de Oliveira. São Paulo:Ed. Difel, 1980.

As fotos foram produzidas pelo próprio autor do texto.





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